Obrigatoriedade da vacina contra Covid em funcionários- Um tema a ser debatido
25 de março de 2021
Conforme se observa, a pandemia da Covid-19 está longe de terminar, infelizmente, e já provoca questionamentos sobre os métodos disciplinares que os empregadores poderiam adotar no ambiente de trabalho e os resultados decorrentes de tais procedimentos.
No que se refere a este tema, o grande entrave, ao meu ver, entre empregadores e estudiosos no âmbito dos direitos trabalhistas e constitucionais é justamente se o empregado pode ou não se recusar em ser vacinado, sob a prerrogativa constitucional de liberdade, da intimidade, e de tanto outros argumentos valiosos e fundamentais ao desenvolvimento dos direitos da pessoa humana, ou se, por outro lado, deve prevalecer o direito público de assegurar a todos a saúde, amenizando, por assim dizer, os direitos individuais em virtude do estado atípico que vivemos nos dias de hoje.
Antes de nos aprofundarmos sobre o tema, é preciso lembrar que no Brasil, atualmente, há diversas vacinas que são obrigatórias por lei, tais como: contra Hepatite B, Difteria, Tétano, Febre Amarela, Sarampo, Caxumba, Rubéola, entre outras. Nesses casos, embora o poder público não possa forçar ninguém a tomar a vacina, aquele que não o fizer sofrerá algumas consequências tanto no âmbito das relações do trabalho, como ficar impossibilitado de receber determinados benefícios sociais, quanto no âmbito civil, como ficar impossibilitado de realizar viagens internacionais.
Como não bastasse isso, ao contratar alguém, a empresa pode exigir a apresentação do comprovante de vacinação e, caso ele não seja apresentado, o candidato a emprego poderá deixar de ser contrato.
Nota-se, portanto, que a sociedade já vem aplicando procedimentos disciplinares contra aqueles que visam escolher outro caminho que não seja a vacinação.
Agora, como enfrentar um debate sobre o direito que o empregado tem de não sofrer a vacinação em seu corpo, sem seu consentimento, ou sem consentimento legítimo, livre da pressão da relação e emprego, e encontrar, por assim dizer, uma forma autorizada para encarrar o contrato de trabalho por justo motivo na hipótese de tal recusa?
Entendo que, para responder tal questionamento, dois pontos devem ser considerados, quais são: i) negociação coletiva – a qual pode estipular a obrigatoriedade da vacinação contra a Covid-19, e, adicionalmente, prever nova figura de justa causa para permitir a dispensa motivada de trabalhadores que se recusarem a fazê-lo, pois, além de legitimar o processo, data a participação do representante constitucional para interesses individuais ou coletivos da categoria (este encontra-se pleno respaldo na legislação trabalhista reformada); e, ii) a tese fixada pelo STF no ARE 1.267.879, em que se discute o direito à recusa à imunização por convicções filosóficas – a saber: “[…]É obrigatória constitucional a obrigatoriedade de imunização por meio de vacina que, registrada em órgão de vigilância sanitária, (i) tenha sido incluída no Programa Nacional de Imunizações ou (ii) tenha sua aplicação obrigatória determinada em lei ou (iii) seja objeto de determinação da União, Estado, Distrito Federal ou Município, com base em consenso médico-científico. Em tais casos, não se caracteriza violação à liberdade de consciência e de convicção filosófica dos pais ou responsáveis, nem tampouco ao poder familiar”. Presidência do ministro Luiz Fux. Plenário, 17/12/2020 (Sessão realizada inteiramente por videoconferência — Resolução 672/2020/STF).[…]”.
Para tanto, ao que tudo indica, em se tratando de saúde pública, deve prevalecer o bem-estar de todos e não se admitira a recusa pelo empregado, mormente em atividades que envolve os cuidados de terceiros ou relacionamento com vulneráveis potenciais. Nessa hipótese, caberia, em respeito às suas convicções, a rescisão do contrato de trabalho sem justa causa.
É importante ponderar que são situações que precisam ser avaliadas in locu e, tal como ocorre com frequência, os aspectos fáticos serão fundamentais para a solução e adequação das regras disciplinares, considerando sempre que se trata de saúde pública e obrigação de todos.
Enquanto a vacinação de toda a população me parece difícil de se vislumbrar, ficamos na fase do uso de máscaras, do controle de aglomeração, e dos cuidados básicos de higiene para impedirmos propagação do vírus. Afinal, não se trata apenas de proteção individual, mas diz respeito à proteção do outro e do modo que se enxerga os valores da vida.
TIAGO NASSER – OAB/MS 8.23E.