A Responsabilidade Objetiva das Instituições Financeiras pelos danos decorrentes de fraudes praticadas por terceiros.
12 de agosto de 2020
Há muito vivenciamos, e mais ainda no mundo jurídico, a submissão dos consumidores quanto aos ataques propagados por hackers e terceiros criminosos em face da vida bancária dos consumidores, que de forma cotidiana tem sua privacidade bancária violada.
E como se sabe, as relações contratuais das instituições financeiras são regidas pelo Código de Defesa do Consumidor, quando presentes os requisitos para tal fim, em consonância com o enunciado da Súmula 227 do Superior Tribunal de Justiça “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”.
Assim, diante de tal premissa, vale dizer que a fraude bancária decorrente de prática de crime não necessariamente afasta a responsabilidade objetiva do agente financeiro perante o consumidor, pois, como dito alhures, há ilícitos criminais que se inserem no risco da atividade, inclusive, por serem, também, ilícitos civis.
Nesse sentido, tem-se elucidada a Súmula 479 do STJ que dispõe: “As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias”
Em recente caso patrocinado por nosso escritório, a situação é a mesma, idêntica e rotineira. O que assusta é a forma que as instituições bancárias encaram essa situação. Ora, no caso em comento, o consumidor imediatamente contestou as operações bancárias, lavrou boletim de ocorrência, comunicou imediatamente à instituição financeira e mesmo assim foi tratado com absoluto descaso.
A instituição financeira, por sua vez, e como de praxe, insiste em negligenciar o tratamento ao consumidor neste tipo de situação. Os atos são os mesmos: Negam a existência de falha na prestação de serviços, defende a culpa exclusiva do consumidor no dever de guarda e segurança do cartão e senha e tentar fazer configurar a sua excludente de responsabilidade, sem ao menos, fazer prova em sentido contrário, como por exemplo, a inviolabilidade de seu sistema.
Ora, a instituição bancária ao permitir que terceiros utilizem de mecanismo ilegais para obtenção de dados pessoais do consumidor, caracteriza-se como fortuito interno, a ser suportado pelo prestador de serviços, ou seja, a instituição bancária.
Não se olvide de que, em decorrência da sua responsabilidade objetiva (art. 14 do CDC), o fato do banco ter sido vítima de uma fraude não o exime do dever de indenizar terceiros de boa-fé que sofreram prejuízos.
E mesmo que houvesse cláusula contratual que previsse a ausência de responsabilidade por operações fraudulentas, esta se mostra abusiva, pois busca onerar o consumidor com um risco inerente à própria atividade bancária.
No caso acima comentado, patrocinado pelo escritório Oton Nasser Advogados, o eminente Des. Relator Francisco Gianquinto, corroborando com a pacificada jurisprudência dos Tribunais Superiores, bem ressaltou:
“ No caso de correntista de instituição bancária que é lesado por fraudes praticadas por terceiros – hipótese, por exemplo, de cheque falsificado, cartão de crédito clonado, violação do sistema de dados do banco – a responsabilidade do fornecedor decorre, evidentemente, de uma violação a um dever contratualmente assumido, de gerir com segurança as movimentações bancárias de seus clientes. Ocorrendo algum desses fatos do serviço, há responsabilidade objetiva da instituição financeira, porquanto o serviço prestado foi defeituoso e a pecha acarretou dano ao consumidor direto.”
Além disso,a indenização por dano moral é plenamente cabível e aplicável ao caso debatido, uma vez que foram efetivadas compras ilícitas através do cartão bancário e contratação de empréstimos mediante fraude, por falha na prestação do serviço do Banco, por falta de segurança nas operações, situação que causa desassossego, perturba a tranquilidade do espírito do sujeito, acarretando-lhe natural preocupação e ansiedade com a situação, comisso e em última análise, o comprometimento da alma, na esfera psíquica, gerando o dever do Banco indenizar pelo dano moral decorrente da falha na prestação de serviço bancário. Confira-se a ementa:
Ação declaratória de inexigibilidade c.c. danos morais e materiais – Transações com cartão bancário do autor, mediante fraude Aplicação da legislação consumerista(súmula 297 do STJ) Responsabilidade objetiva da instituição financeira Aplicação da teoria do risco do negócio Matéria pacificada pelo julgamento do Recurso Especial nº 1.199.782/PR, com base no artigo 543-C do Código de Processo Civil Súmula 479 do STJ Incontroversa utilização do cartão do autor Banco réu não se desincumbiu do ônus de demonstrar a regularidade das transações efetuadas com o cartão bancário do autor (art.6º, VIII, da Lei nº 8.078/90) Débitos inexigíveis Sentença mantida Recurso do réu negado. Danos morais – Comprovação a partir da ocorrência do fato – Damnun in reipsa – Valor do dano moral arbitrado em consonância com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade – Sentença mantida – Recurso negado.
(TJSP – Apelação nº 1009968-63.2019.8.26.0554, Des. Relator FrancisoGianquinto, 13ª Câmara de Dir. Privado).
Portanto, embora o assunto seja conhecido por todos e com efeitos práticos no dia a dia, muitos consumidores tem esbarrado na tese envolvida pelas instituições financeiras e muitas das vezes, assumem a culpa pela responsabilidade que não lhe incumbe, peculiaridades essas, que devem ser sempre assistidas por um advogado, como demonstrado no caso supracitado, com a provocação do Poder Judiciário para que seja resguardado o direito do consumidor diante do entendimento pacificado pelos Tribunais Superiores sobre este assunto.
Lucas Nasser de Mello
OAB/SP 412.652
OAB/MS 21.500